Governo reforça ações para combater violência sexual contra crianças e adolescentes na internet

O avanço da tecnologia e a popularização do acesso à internet têm trazido inúmeros benefícios para o aprendizado e a socialização, mas também abriram novas portas para riscos graves. Entre eles, está a violência sexual contra crianças e adolescentes no ambiente digital — crime que pode assumir diferentes formas, como aliciamento, assédio, pornografia infantil, cyberbullying e exposição não autorizada de imagens. Casos recentes, como a denúncia feita pelo influenciador Felca sobre a adultização infantil e a exploração de imagens de crianças em plataformas digitais evidenciam a urgência da pauta. Visando a proteção deste público, o governo federal tem implementado uma série de medidas para combater esse tipo de violência, com iniciativas voltadas à prevenção, à responsabilização e ao apoio às vítimas. No âmbito do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), por meio da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA), foram criadas ações estratégicas, articulando políticas públicas e mobilizando parceiros para enfrentar o problema de forma integrada e efetiva. Diagnóstico da Violência Sexual Online: Em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a SNDCA produziu o Diagnóstico da Violência Sexual Online de Crianças e Adolescentes. O estudo reúne dados inéditos sobre a ocorrência desses crimes, identifica padrões de aliciamento e aponta métodos formativos e estratégias preventivas para subsidiar políticas públicas. Ele também inclui recomendações específicas para atuação em escolas, redes de proteção e órgãos de segurança pública. Banco de Boas Práticas – Portal ENDICA: Para facilitar a troca de experiências, o MDHC mantém o Banco de Boas Práticas no Portal ENDICA, reunindo 55 ações replicáveis de enfrentamento à violência sexual digital. Essas iniciativas foram implementadas por diferentes municípios, estados e organizações da sociedade civil, e podem ser adaptadas a outras realidades. O acervo inclui campanhas educativas, protocolos de atendimento, formações para profissionais e projetos de mediação escolar. Para a secretária nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Pilar Lacerda, o primeiro passo para o combate desses crimes é a regulamentação das plataformas virtuais. “Infância não é conteúdo ou palco para lucro. As plataformas digitais também têm responsabilidade e precisam adotar medidas efetivas de proteção”, afirma. Ações interministeriais Diretrizes do Conanda e Comitê Intersetorial: O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) publicou as Resoluções nº 245 e nº 257, que definem princípios e diretrizes para garantir os direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital. Essas resoluções serviram de base para a Portaria Conjunta nº 1/2025, que instituiu o Comitê Intersetorial para a Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente no Ambiente Digital. O comitê reúne órgãos do governo federal, representantes da sociedade civil, especialistas e autoridades de aplicação da lei para construir políticas integradas e permanentes de proteção online. Ao reforçar a importância da proteção integral prevista em lei, a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, destacou a necessidade de garantir que as mesmas regras aplicadas presencialmente também se estendam ao ambiente virtual. “É importante a gente frisar que o que nos orienta é o Estatuto da Criança para o Adolescente (ECA). O que vale no mundo físico, vale no ambiente digital”, ressalta. Guia “Crianças, Adolescentes e Telas”: Coordenado pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secomom/PR) com participação de outros seis ministérios — inclusive o MDHC —, o guia oferece orientações para famílias, educadores e gestores sobre como promover um uso saudável e seguro da tecnologia, abordando temas como tempo de tela, segurança online, privacidade, mediação parental e prevenção de riscos — incluindo a violência sexual digital. Disponível gratuitamente na internet, a publicação também estimula o diálogo entre responsáveis e crianças, de forma a fortalecer a confiança e a capacidade de identificar situações perigosas. Lei nº 14.811/2024: Sancionada em janeiro de 2024, o dispositivo criminaliza o bullying e o cyberbullying, tipificando-os no Código Penal e incluindo-os no rol de crimes hediondos quando houver resultado de lesão corporal grave ou morte. Na prática, isso significa punições mais severas para quem pratica intimidação sistemática, seja presencialmente ou por meio eletrônico. A lei também atualiza dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para reforçar a proteção contra violências digitais. Segundo Pilar Lacerda, o bullying online muitas vezes serve como porta de entrada para violências mais graves, incluindo crimes de caráter sexual. “Ao criminalizar o bullying e o cyberbullying de forma mais rigorosa, estamos enviando uma mensagem clara: não aceitaremos comportamentos que atentem contra a dignidade e o desenvolvimento de crianças e adolescentes”, destaca. DCIBER: combate especializado a crimes virtuais: Outra frente essencial é a Diretoria de Combate a Crimes Cibernéticos (DCIBER), criada no âmbito da Polícia Federal (PF). A unidade é especializada em investigar crimes digitais, com equipes treinadas para rastrear conteúdos ilícitos, identificar autores e desmantelar redes de exploração sexual online. Desde a sua criação, a DCIBER já coordenou 409 operações voltadas ao combate de crimes cibernéticos, com foco na repressão à produção, armazenamento e compartilhamento de material de abuso sexual infantil. Essas ações já resultaram em: Muitas dessas operações contam com cooperação de órgãos estrangeiros, ampliando a capacidade de resposta do Brasil no cenário global. Denúncia e atendimento às vítimas Para casos de suspeita ou confirmação de violência sexual contra crianças e adolescentes, o Disque 100 permanece como um dos principais canais de denúncia. O serviço é gratuito, funciona 24 horas por dia e permite atendimento anônimo. Os casos são analisados individualmente e encaminhados, principalmente, para o Conselho Tutelar, além de outros órgãos como Ministério Público, Delegacias Especializadas e serviços de assistência social. Gerenciado pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, vinculada ao MDHC, ainda existem iniciativas como a Ouvidoria Itinerante, que realiza ações presenciais em diferentes regiões do país, especialmente em áreas de difícil acesso, para ampliar o alcance da proteção de direitos e ouvir diretamente as demandas da população, incluindo crianças e adolescentes.

Caminhos da Reportagem mostra perigos para jovens na internet

Nesta segunda-feira (11), a TV Brasil exibe, às 23h, um novo episódio do programa Caminhos da Reportagem que tem como tema a Adolescência conectada ao perigo. A atração analisa a relação que grupos na internet mantêm com o aumento de casos de crianças e adolescentes envolvidos com crimes. No Brasil, 95% das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos estão conectados, cerca de 25 milhões de jovens. Apesar de plataformas digitais como Discord (13+), TikTok (14+), Instagram/Facebook (16+) e X/Twitter (18+) tenham faixas etárias indicadas, o acesso ainda é livre e sem fiscalização. Para Thiago Tavares, presidente da SaferNet Brasil, ONG que atua na defesa e promoção dos direitos humanos na internet, os problemas começam desde desafios virtuais até comportamentos de risco. “Por meio de um celular, eles podem acessar conteúdos de extrema violência, se conectar com criminosos e até serem recrutados para o cometimento de crimes bárbaros”, alerta. Ao Caminhos da Reportagem, a psiquiatra Gianna Guiotti explica que há um desejo de pertencimento. “o adolescente se submete a atitudes prejudiciais porque quer ser aceito”. Já a médica Evelyn Eisenstein, da Sociedade Brasileira de Pediatria, acrescenta que as redes sociais são como uma espécie de “droga digital”. O programa traz casos reais que ilustram essa situação. Por exemplo, em 2022, um jovem de 18 anos, ex-aluno de uma escola de Vitória (ES), planejou um ataque articulado em grupos online. “Começou a se vestir de preto, se trancava no quarto conectado à internet e ficou mais irritado”, lembra a mãe. Timpa, jovem negro de origem humilde, foi cooptado por grupos extremistas. “Me pegaram no discurso de ‘homem beta’. Culpavam as mulheres por tudo. Só depois percebi que havia racismo, neonazismo e ameaças. Quando tentei sair, recebi ameaças graves e tive problemas de saúde”, relata. Atenção aos sinais O procurador de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Fábio Costa Pereira, defende que os pais precisam observar os sinais. “Acham que o filho é quieto, que só joga no quarto, mas não estranham ele passar seis ou sete horas seguidas isolado”, diz.  No Ministério da Justiça, o Ciberlab, um hub de segurança cibernética, monitora crimes virtuais 24 horas por dia. “Já vimos meninos obrigarem meninas a se mutilarem com estiletes e marcarem o nome deles nas partes íntimas. É perverso”, afirma Alessandro Barreto, coordenador do laboratório. Em São Paulo, a delegada Lisandrea Colabuono ressalta que “o cyberbullying, que muitos minimizam, é o gatilho para automutilações”. Nos últimos seis meses, o núcleo paulista monitorou 300 alvos e salvou mais de 120 vítimas. Luiza Teixeira, especialista da Unicef, evidencia que existem ferramentas eficazes para detectar e remover conteúdos de abuso, “mas falta uma legislação que obrigue o uso”. Para ela, “as big techs têm responsabilidade nisso. Capacitação e diálogo Após ataques a escolas no Rio Grande do Sul, o Ministério Público passou a capacitar educadores para identificar sinais de risco. “Houve um caso em que a diretora agiu após uma capacitação. O aluno, que sofria bullying e apresentava comportamento estranho, foi atendido a tempo”, relata Fábio Costa. Isolamento repentino e interesse por violência são sinais que merecem atenção. “Mudanças de comportamento, transtornos do sono, da alimentação, vida sedentária, problemas de saúde mental, irritabilidade e agressividade. Iisso tudo acende uma luz de alerta”, enfatiza a pediatra Evelyn Eisenstein.