Os desafios da escalada na carreira política

A miopia do poder: Os desafios da escalada na carreira política

A ascensão na carreira política é um processo repleto de armadilhas intelectuais, emocionais e estratégicas. Um dos principais obstáculos que impede muitos líderes políticos de evoluírem com sucesso é o que se pode chamar de “miopia do poder” — a crença equivocada de que as mesmas estratégias, discursos e posturas que funcionaram em cargos anteriores serão suficientes para conquistar novos patamares de liderança.

Essa miopia é evidente, por exemplo, quando um vereador deseja se tornar prefeito, mas insiste em replicar as mesmas táticas que o elegeram para a câmara municipal. O mesmo ocorre com prefeitos que tentam ser deputados estaduais, ou com deputados estaduais que almejam o Congresso Nacional. A falha em compreender que cada nível político exige um conjunto diferente de habilidades, relações e visão de mundo pode comprometer toda uma trajetória promissora.

A armadilha do sucesso passado

Na política, assim como em qualquer carreira, o sucesso anterior pode se tornar um fardo quando mal interpretado. Líderes políticos frequentemente acreditam que a autenticidade de sua jornada os tornará automaticamente aptos para voos mais altos. No entanto, cada novo cargo político demanda uma adaptação profunda — tanto no conteúdo quanto na forma da atuação.

Um vereador que foi eleito com base em um discurso de proximidade com o bairro, por exemplo, terá que aprender a lidar com questões muito mais amplas e complexas como prefeito — envolvendo gestão orçamentária, articulação intergovernamental, políticas públicas estruturantes e relacionamento com diversos setores da sociedade.

Do ponto de vista psicológico, muitos líderes políticos enfrentam um bloqueio chamado de viés de confirmação. Eles tendem a valorizar apenas os dados que reforçam suas crenças e desconsiderar sinais claros de que precisam mudar. A vaidade e a insegurança também desempenham um papel importante: admitir que é preciso mudar a forma de liderar pode ser interpretado por alguns como sinal de fraqueza, quando na verdade é uma prova de maturidade e inteligência emocional.

Intelectualmente, há uma exigência de expansão do repertório. Isso inclui desde a capacidade de ler cenários complexos até compreender novas linguagens — a da mídia, do eleitorado ampliado, dos bastidores do poder e das alianças partidárias. O político que quer crescer precisa ser um eterno aprendiz, disposto a atualizar suas ideias, rever posicionamentos e até abandonar certas bandeiras em prol de um projeto maior.

Erros comuns na transição de cargos

Os principais erros cometidos por políticos que tentam escalar sua carreira incluem:

  1. Repetição de estratégias obsoletas – Campanhas eleitorais não são fórmulas fixas. O que funcionou em uma eleição local pode não surtir efeito em um cenário mais amplo.
  2. Desconexão com a nova base eleitoral – Um prefeito que tenta ser deputado precisa conquistar votos em cidades vizinhas, dialogar com públicos diferentes e construir uma imagem mais plural.
  3. Falta de posicionamento estratégico com a imprensa – O relacionamento com a mídia deve ser mais sofisticado à medida que o político sobe de cargo. A imprensa regional ou estadual exige clareza, coerência e habilidade em lidar com narrativas.
  4. Postura incoerente com o novo papel – Continuar agindo como “vereador combativo” quando se ocupa um cargo de gestão é um erro fatal. Cada cargo exige uma postura correspondente.

Alianças políticas e relação com a imprensa

A formação de alianças é uma etapa fundamental na ascensão política. Subir na hierarquia exige articulação com grupos diversos, habilidade de negociação e, muitas vezes, concessões estratégicas. A pureza ideológica pode ser uma armadilha se impedir o diálogo e a construção de pontes.

Já o relacionamento com a imprensa deve evoluir da reatividade para a proatividade. Em vez de responder a crises, o político precisa aprender a construir uma narrativa pública coerente, que fortaleça sua imagem e antecipe possíveis ataques. A construção de reputação passa por assessorias competentes, presença estratégica nas redes sociais e domínio da comunicação institucional.

A escalada na carreira política exige mais do que ambição: requer visão estratégica, autoconhecimento, empatia social e capacidade de adaptação. A “miopia do poder” pode ser superada quando o político entende que liderar em diferentes níveis exige mais do que repetir fórmulas — exige reinventar-se, evoluir e compreender o novo papel que o eleitor espera que ele desempenhe.

Quem não estiver disposto a mudar, ouvir e aprender com os erros, inevitavelmente ficará para trás — substituído por lideranças mais preparadas para o presente e o futuro da política.

Elcio V. Barbosa

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